Na Grã-Bretanha, Liz Truss é forçada a renunciar à medida que o armagedom se aproxima

Liz Truss, que se inspira em Margaret Thatcher, foi forçada a renunciar em meio a uma crescente crise política.

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Até ontem, os especialistas previam que ela poderia durar alguns dias. Simon Clarke, o ministro a subir de nível, estava dizendo que, apesar da turbulência, Truss era “surpreendentemente resiliente” e estava determinada a seguir em frente.

No final, ela conseguiu se agarrar por apenas uma questão de horas. Com o caos tomando conta de Westminster e o Partido Conservador implodindo, sua autoridade política se exauriu completamente.

Ela durou apenas 45 dias no cargo, tornando-se a primeira-ministra com o mandato mais curto da história britânica.

Monstros espreitam

Truss deixará o posto em uma semana, após o concurso para a escolha de seu substituto.

A eleição de um novo líder conservador e primeiro-ministro representa um problema. Dada a natureza reacionária e perturbada dos membros do Partido Conservador, o establishment moverá céus e terra para excluí-los da escolha do próximo líder.

Mas é possível que a classe dominante não seja capaz de costurar o processo. O Comitê de 19221 do partido está reunido esta noite (20) para decidir as regras. Eles podem acabar oferecendo aos filiados do Partido Conservador uma opinião por meio de uma votação online.

E quem sabe que tipo de monstro essas fileiras raivosas podem escolher.

“Louco, mau e perigoso”

A Grã-Bretanha, outrora a poderosa oficina do mundo, hoje tem todas as características de um país do “terceiro mundo”. Anteriormente o país mais estável da Europa, o Reino Unido tornou-se o mais instável.

A eleição de Liz Truss como líder conservadora, apenas algumas semanas atrás, foi anunciada pela gangue do Brexit como a cereja do bolo. Agora, finalmente, a Grã-Bretanha seria transformada em uma Cingapura desregulamentada e com baixos salários, com o novo primeiro-ministro prometendo uma economia “que tiraria vantagem das liberdades do Brexit”.

Até a classe dominante ficou alarmada com o que isso poderia significar, na prática. Os capitalistas querem “estabilidade”, paz e sossego para continuarem a ganhar dinheiro. A calamidade de um Brexit duro foi o suficiente para eles. Mas, em vez disso, eles tinham uma primeira-ministra se oferecendo para incendiar a terra e brigar com todos, e tudo por conta de uma agenda econômica imprudente e utópica.

Truss, selecionada pelas fileiras raivosas do Partido Conservador, foi o líder mais inepto e estúpido que já residiu em Downing Street2 – um reflexo da degeneração do Partido Conservador e seus representantes.

“Essas pessoas são loucas, más e perigosas”, afirmou Martin Wolf no Financial Times, falando em nome do establishment burguês. “Eles têm que ir embora”.

Retirada e rebelião

A tentativa de aprovar um pacote de cortes de impostos não financiados para os ricos no “mini-orçamento” do mês passado levou a um colapso do mercado. Tudo então começou a desmoronar rapidamente, com o Banco da Inglaterra forçado a intervir quando a libra despencou e os custos dos empréstimos dispararam.

Forçada pelos mercados a realizar uma série de reviravoltas dramáticas, Truss foi pressionada a demitir seu chanceler, Kwasi Kwarteng. Isso foi logo seguido por um recuo em todo o seu programa econômico.

Ela então perdeu seu secretário do Interior ontem. Suella Braverman ocupou o cargo pelo período mais curto desde o duque de Wellington em 1834.

Em um sinal de sua fraqueza, os oponentes políticos de Truss dentro do Partido Conservador, Jeremy Hunt e Grant Shapps, foram impingidos a ela, ocupando os cargos de chanceler e secretário do Interior, respectivamente.

Hunt rapidamente descartou a maioria dos cortes de impostos de Truss, prometendo estabilidade econômica e decisões surpreendentes em relação aos gastos públicos.

Durante todo esse tempo, os parlamentares conservadores estavam se rebelando abertamente no Parlamento. Houve tumulto na Câmara dos Comuns, incluindo gritos e empurrões, e ameaças de expulsão do partido. O governo de Truss estava claramente desmoronando.

Movimentos de rebanho

A posição de Truss nas pesquisas de opinião caiu. Da mesma forma, o apoio público aos conservadores despencou, com o Partido Conservador em cerca de 20% e os trabalhistas com mais de 50%.

Centenas de parlamentares conservadores estavam enfrentando uma possível eliminação. A confiança em sua liderança evaporou. E nas famosas palavras de Boris Johnson: “Quando o rebanho se move, o rebanho se move”.

Essas bestas conservadoras certamente estavam em movimento, desesperadas para salvar suas peles políticas. Um número crescente deixou de enviar cartas de confiança a Graham Brady, o presidente do Comitê de 1922 de primeiros-ministros conservadores. A pressão aumentou. E Truss acabou sendo forçado a ceder.

Golpe do establishment

A ação foi realizada com a nomeação de Jeremy Hunt como chanceler. Ficou claro neste momento que os “moderados” conservadores – apoiados pelo establishment – estavam planejando um golpe contra a ala libertária e radicalmente favorável ao Brexit no partido. A partir de então, os dias de Truss estavam contados. Ela era uma primeira-ministra apenas no papel.

A classe dominante havia perdido o controle sobre o Partido Conservador. Eles estavam cansados de pessoas como Boris Johnson, depois Truss, bem como de seus representantes políticos – esses líderes míopes, egoístas e degenerados.

Mas agora eles estão determinados a recuperar o controle, como fizeram no Partido Trabalhista através de Starmer e da ala direita.

Isso significa estabelecer novas regras para manter os filiados dos conservadores longe de qualquer tomada de decisão. A ideia de um candidato unificador parece descartada, dadas as divisões dentro do partido. O grupo de deputados do European Research Group (ERG)3, de direita e eurocéticos (que não acreditam ou desconfiam da União Europeia), ainda tem uma influência considerável.

Notavelmente, há rumores de que Boris Johnson pode até concorrer à liderança, “no interesse nacional”. Afinal, ele realmente ganhou uma eleição geral. Como disse um parlamentar conservador: “É hora de o chefe voltar!”.

“Sir” Starmer

A classe dominante estará ansiosa para que alguém como Rishi Sunak se levante e vença. Ele seria mais um “par de mãos seguro”. Sob sua liderança, eles esperavam reconstruir o Partido Conservador. Mas, dada a crise econômica que se aprofunda e a austeridade necessária, essa não é uma tarefa fácil.

Outra opção para a classe dominante seria forçar uma eleição geral e entregar o poder ao “Sir” Keir Starmer. Tradicionalmente, afinal, os governos trabalhistas de direita eram trazidos para fazer a limpeza depois de uma bagunça dos conservadores, apenas para serem removidos logo depois de fazerem seu trabalho sujo.

Claramente, Starmer gostaria de desempenhar esse papel, novamente “no interesse nacional”.

Tal governo não seria um governo “reformista”, mas um governo inclinado a equilibrar as contas. Seria um governo de crise, como o de Ramsay MacDonald em 1931, preparando novas convulsões sociais e políticas.

Omni-crise

A Grã-Bretanha enfrenta uma “omni-crise” (crise total) em todos os níveis. Para a classe capitalista, as galinhas estão voltando para dormir no galinheiro.

O declínio do capitalismo britânico significará cortes nos padrões de vida da classe trabalhadora. O custo da energia vai espiralar. E o buraco de 40 bilhões de libras no orçamento do governo será preenchido às nossas custas, além da catástrofe do custo de vida. Pelo menos este é o plano.

Isso, no entanto, é uma receita para um amargo conflito de classes – agora e no futuro. Não haverá retorno à estabilidade. Isso está descartado. Pelo contrário, a turbulência e a instabilidade serão uma característica permanente do capitalismo britânico, à medida que oscila de uma crise para outra.

A atual onda de greves é uma amostra do que está por vir. Trabalhadores ferroviários, portuários e postais estão todos agindo. Profissionais de saúde e professores, entre outros, estão votando para a ação. Muitos nunca estiveram em greve antes.

Diante do aumento da inflação, essa militância industrial se intensificará, com os sindicatos preparados para uma ação coordenada. Isso representa o despertar da classe trabalhadora na Grã-Bretanha.

Se o governo conservador sobreviver tempo suficiente para introduzir mais legislação anti-sindical, isso apenas jogará mais lenha na fogueira.

Caixa de Pandora

A situação na Grã-Bretanha está sendo transformada. Os conservadores e os patrões abriram uma Caixa de Pandora. Ao fazê-lo, preparam-se convulsões revolucionárias.

Resta construir uma alternativa revolucionária para pôr fim ao pesadelo da crise capitalista.

Outro primeiro-ministro conservador partiu. Boa despedida! Mas isto não é o suficiente.

Como afirmou o líder do Sindicato Nacional dos Trabalhadores Ferroviários (RMT), Mick Lynch, precisamos de uma revolta – uma que coloque todo o sistema capitalista podre onde ele deve estar, na lata de lixo da história.


1 O Comitê de 1922, formalmente conhecido como o Comitê de Membros Privados Conservadores, é o grupo parlamentar do Partido Conservador na Câmara dos Comuns britânica. O comitê, composto por todos os parlamentares conservadores que não ocupam cargos no governo, reúne-se semanalmente enquanto o Parlamento está em sessão e fornece um meio para os parlamentares coordenarem e discutirem seus pontos de viste independentemente ddaqueles que ocupam cargos. O comitê também pode desempenhar um papel importante na escolha do líder do partido.

2 Downing Street é uma rua em Westminster, em Londres, que abriga as residências e escritórios oficiais do Primeiro Ministro do Reino Unido e do Chanceler do Tesouro.

3 O European Research Group (ERG) é um grupo dentro do Partido Conservador Parlamentar que fornece atividades de pesquisa e coordenação – como cartas públicas sobre o Brexit e organização informal – para parlamentares conservadores eurocéticos.

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